Na
descida da falésia até ao mar, observo duas pessoas cruzarem-se numa escadaria
a pique. Uma desce, a outra sobe. Não se conhecem. No cruzamento trocam uma ou
duas palavras, mas sobretudo a postura dos seus corpos e talvez um certo ritmo
cardíaco permite uma estranha forma de reconhecimento, involuntário mas atento,
e uma certa comunidade, como se há muito se conhecessem. Seguem caminho. Desço
as escadas e cruzo-me com a pessoa que sobe. Pergunto-lhe qualquer coisa
objectiva. De olhos fixos na pedra, mas esforçando-se por ser cordial, diz-me
que não sabe nada sobre o que eu lhe pergunto, que não pode saber. Só vê a
escada, procurando agarrar-se como pode a um terreno extremamente escorregadio.
Ainda tenta olhar para mim, mas é tomada por um grande desequilíbrio. Só depois
da frustração de não obter a resposta desejada percebo que ela sofre de
vertigens. Percebo então que naquele cruzamento que observei entre os dois se
deu um encontro no meio das vertigens que ambos sentiam e presumo que, por um momento,
tenham sentido um breve conforto naquela escadaria.
Sem comentários:
Enviar um comentário