sexta-feira, 17 de novembro de 2023

imagens e mais imagens

Quando ouvi aquela música na rádio, o aqui ao luar, dos Xutos, a impressão foi intensa. mesmo apresentando-se esbatida ou longínqua, era forte e parecia querer arrancar-me dali. A sensação de ter esquecido a fonte daquela intensidade perturbava. algo nela me era muito familiar, importante, sem dúvida, mas não me lembrava de onde. Fiz pisca para a esquerda, indecisa, pois se optasse pela lasanha feita em vez do jantar de petiscos ainda a fazer com húmus e guacamole, deveria fazer pisca para a direita, uma buzinadela de algum estressado atrás de mim, as miúdas a fofocar lá atrás e, apesar da confusão de sons e de acções sobrepostas, apesar de procurar manter-me concentrada nas minhas acções imediatas, aqueloutra impressão parecia ainda mais imediata e a sua intensidade, mesmo depois de diminuir o som da  música, para me manter atenta, destacava-se. A impressão ganhou autonomia à minha revelia. Traçava o seu próprio percurso. aquela música tinha activado um dispositivo qualquer e começavam a cair imagens e mais imagens, como na descida de Virgílio, como naquelas máquinas antigas de diapositivos, caíam e projectavam-se no ecrã da minha cabeça. Mas eu afastava-as, porque tinha de ver a estrada, ultrapassar a barreira sonora, deixar a senhora e o seu cão atravessarem na passadeira e não deixar de esboçar um sorriso. Iam caindo com uma sequência algo dispersa, mas começavam a fazer sentido, já sabia de onde vinha a música. Tocava num restaurante de praia, depois de um jantar com muitas pessoas, e tinha ficado gravada no meu corpo quando saí para a falésia e desci as escadas até à praia. impressão complexa, esta, quando a recebi no carro, era já feita de tantas camadas de imagens e associações de impressões. não podia dizer da impressão que a música me causara que estava no passado nem no presente, ela era puro virtual, sempre outra, à luz do devir da minha vida.

Sem comentários:

Enviar um comentário