quinta-feira, 7 de julho de 2016

algumas faces de um cristal: o beijo

Jinny andava a correr, depois do pequeno almoço, e viu que as folhas se mexiam numa abertura da sebe. Pensou que fosse um pássaro no ninho, sentia-se assustada, as folhas continuavam a mexer-se. Passou a correr por Susan, Rhoda, Neville e Bernard, que conversavam na casa das ferramentas. Gritava e corria, cada vez mais depressa. As folhas verdes agitavam-se, o seu coração agitava-se. Foi contra Louis no meio dos arbustos e beijou-o. O seu coração saltava e as folhas continuavam a mexer-se sem haver nada a fazê-las mexer. Susan viu Jinny beijar Louis. Levantou a cabeça do seu vaso de flores e espreitou pela abertura da sebe e viu-os beijarem-se. Sentiu que tinha de embrulhar a sua ansiedade num lenço, dar-lhe um nó e fazer dele uma bola para a deixar entre as raízes das faias. Iria alimentar-se de nozes, procurar ovos entre as sarças e morrer ali. Bernard viu Susan a passar por eles, levava um lenço amarrotado como uma bola nas mãos. Os seus olhos pareciam os olhos de um gato antes de saltar. Deixou Neville e seguiu-a cuidadosamente para a poder consolar quando ela, cheia de raiva, pensasse : estou sozinha.

[paráfrase de um beijo narrado n'as Ondas de Virginia Woolf]

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