Penso no bando de nuances de sensações que imagino como aqueles bandos
de Michaux ou de pássaros ou de cardumes em movimento que, numa intuição tão vaga quanto precisa de perigo iminente, ondulam num movimento puro de afectos expresso por
gradações, nuances. Aproximam-se, tocam-se, passam umas nas
outras para de imediato se distinguirem intensa, subtilmente. Tudo se
quer encontrar com tudo, numa emergência contínua de irregularidades,
anomalias, disfunções, de bruscas interrupções sufocantes e retomadas
de ar puro. E neste jogo, por vezes um combate violento, para além das
separações e uniões mais ou menos brutais, há uma série de padrões que
se repetem mas nunca iguais, pois cada gesto sendo vivo, quente, rítmico
não conhece a repetição mecânica e a forma que cria é sempre um anseio
de forma. Que difícil é hoje encontrar a nuance. Tudo insuportavelmente peneirado, abarrotado, espartilhado. Encontra-se fora, seguramente, mas
não basta sair. É por isso que o céu e os movimentos das nuvens ou as
ínfimas percepções do enorme mar (e talvez o deserto), algumas músicas e
algumas imagens, têm esse efeito de um inquietante apaziguamento: como que
assegurando-nos que a nuance insiste, persiste. Mas é preciso tempo vivo (este
segundo, esta hora) para captá-la na espuma indiferenciada dos dias.
Sem comentários:
Enviar um comentário