segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

um charme



alguém dizia que esta minha tendência em espalhar-me pelo espaço como faço quando estou em algum lado, em que vou espalhando os objectos que trago comigo, até que, aos poucos, há marcas minhas um pouco por todo o lado, que esta tendência fazia parte do meu charme... espalhar em cima da mesa. espalhar pela sala. aqui, um lenço, ali o saco, depois, ali no canto, o telemóvel, uma caneta, etc. até na praia acontece, ou no campo. não tenho só um montinho com as minhas coisas. há um momento em que já são dois, e se for preciso três. consoante as deslocações. parece que preciso de fazer um pequeno mapa por todo o lado, até no café da esquina, se mudo de mesa ou assim. é um movimento de dispersão, de proliferação, de repetição. de territorialização e de desterritorialização. de marcação, como a urina dos cães, dos gatos, pelo espaço, mas também de fuga. os animais não têm é tanta tralha, só o que está agarrado ao corpo. na verdade isto nunca me incomodou muito, provavelmente porque não reparo, não vejo de fora. se é um charme, não é meu. já o vi noutros, este charme. não é meu. sobretudo é qualquer coisa que acontece no decurso de uma maneira de viver o espaço e o tempo, as relações com as pessoas, com as coisas. mas se me der conta de uma aparente ocupação na folha de papel, se vejo tudo ocupado pelas minhas palavras, fico agoniada e com vontade de ver tudo vazio. surge esta urgência de criar vazio. por ser um espaço-tempo abstracto, a folha branca pode tão facilmente deixar-se ocupar inteiramente por mim. é preciso torná-la concreta, fazer dela um espaço da vida. da vida que nunca é nossa.

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