sexta-feira, 8 de março de 2024

Abrir para dentro


A atenção ao mundo não vem de dentro. O ensimesmar-se numa mania identitária reside talvez no mal entendido do movimento ser de dentro para fora: olhos que abrem para fora, botões fechados que desabrocham, mãos que se estendem, o corpo que caminha pela estrada afora, a atenção que se activa, despertando de um estado de adormecimento para o mundo que está fora. Regra geral dá-se sempre primazia a um estado anterior interior, a um dentro que se abre, do útero ao mundo. Mas é efectivamente apenas um hábito da razão. Uma imagem a que estamos acostumados. O cinema é naturalmente uma forma privilegiada de romper com essa imagem do dentro-fora, pois nele está-se sempre já no mundo. Fora. O movimento de abertura faz-se de fora para dentro, quer dizer, ao contrário, sem deixar de ser abertura. Num modo especial de ser do aberto, numa imobilização que vem de um adentrar-se desventrando-se.

Sem comentários:

Enviar um comentário