" Nas águas doces do México vive uma espécie de salamandra
albina que há muito tempo atraiu
as atenções dos zoólogos e dos estudiosos da evolução animal. Quem tenha
tido a oportunidade de observar um espécimen em aquário fica surpreendido com o
aspecto infantil, quase fetal, deste anfíbio: a cabeça relativamente grande e
enterrada no corpo, a pele opalescente, com uma leve mancha de cinzento no
focinho e azulada e rosada nas excrescências febris à volta das guelras, as
delicadas patas com dedos em forma de flor-de-lis.
A princípio o axolotl foi classificado como uma espécie própria, com a particularidade
de manter durante toda a vida características tipicamente larvares para um
anfíbio, tais como a respiração branquial e a permanência exclusiva na água.
Tinha, aliás, sido provado sem discussão possível que se tratava de uma espécie autónoma, pelo facto de
o axolotl apesar do seu aspecto infantil, ser perfeitamente capaz de se
reproduzir. Só mais tarde uma
série de experiências permitiu por em evidência que, depois de receber hormonas
tiroideias, o pequeno tritão passava pela metamorfose habitual dos anfíbios:
perdia as brânquias e, desenvolvendo a respiração pulmonar, abandonava a vida
aquática para se transformar num exemplar adulto de salamandra mosqueada
(Amblistoma Tygrinum). Esta circunstância pode levar a classificar o axolotl
como um caso de regressão evolutiva, uma espécie de derrota na luta pela vida,
que obriga um batráquio a renunciar à parte terrestre da sua existência e a
prolongar indefinidamente a sua vida larvar. Mas desde há algum tempo este
infantilismo obstinado (pedomorfose ou neoténia) forneceu as chaves para
entender de modo novo a evolução humana."...
Giorgio Agamben, Ideia da Prosa
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